quarta-feira, janeiro 23, 2008

Blade Runner

Pois é. Este blog anda precisando de atualização... Mas sabe como é, eu não o estava atualizando por estar ocupado fazendo coisas bacanas, de tal forma que, quando viesse a escrever algo aqui, teria algo interessante pra contar.

Enfim, uma das coisas que faz mais tempo que estou pra contar aqui é que revi Blade Runner, mas agora na sua nova versão, The Final Cut.

O filme é muitíssimo bacana e certamente um dos meus favoritos, não apenas dentro do gênero ficção científica.

Um tempo atrás (em 1997, pra ser mais exato), eu comprei um Laserdisc com a dita "versão internacional" do filme, isto é, aquela que foi exibida nos cinemas fora dos EUA (esse LD é da Criterion Collection). Nessa época fiquei obcecado com o filme, eu o havia visto algo como 30 ou 40 vezes, sabia os diálogos todos de cor etc, mas logo (em uns 2 anos) abandonei esse vício.

Engraçado é que mesmo com esse fanatismo todo pelo filme, nunca cheguei a ver a versão do diretor, lançada em 1992, que trazia algumas alterações um tanto drásticas no filme, notavelmente a remoção do voice-over do personagem Deckard (que servia para explicar determinadas coisas para os espectadores), a remoção do final feliz e a adição da "cena do unicórnio", que aparece como um sonho maluco de Deckard.

Apesar de nunca ter visto essa versão, eu tinha a impressão de que a ausência do voice-over fosse comprometer o filme, mas achava interessante terem removido o final feliz, isso parecia ser algo bacana.

Bom, cá estou eu, em 2008, uns bons 8 ou 9 anos depois da última vez que vi Blade Runner, vendo essa versão final do filme. E o que essa versão final, definitiva etc acrescenta de interessante? Bem, a verdade é que não acrescenta muito. É basicamente o mesmo que a versão do diretor (sem voice-over, sem final feliz, com unicórnio), mas com uma remasterização delícia cremosa, isto é, áudio e vídeo de primeira e umas mexidinhas aqui e acolá, detalhes pequenos, que mais interessam aos nerds que decoram filmes (uau, esse corte costumava ser 17 frames depois!).

Enfim, confesso que rever Blade Runner me surpreendeu um bocado. Inicialmente por causa dos efeitos especiais e de toda a concepção visual. É impressionante como esse filme, feito em 1982, jamais parece datado, ao contrário de... bem, praticamente qualquer filme de ficção científica lançado há mais de 20 anos. Mais: os cenários, a cidade futurista, os efeitos, são tão bons que superam também muitos filmes modernos, já que recentemente a moda é rechear tanto os filmes com imagens feitas por computador, a ponto de fazê-los parecer videogames.

Para mim, confirma-se mais do que nunca que Blade Runner é sinônimo de efeitos visuais cinematográficos feitos com arte, coisa que sempre foi rara mas que parece se tornar ainda mais rara com o passar do tempo.

O impacto dessa obra (e aqui 'obra' refere-se a Blade Runner como produção visual) é, portanto, inegável. Trata-se de um marco, que, com traços fortes, como a feliz combinação entre ficção científica e film noir, mudaria para sempre o imaginário visual dos artistas (e das pessoas em geral) em relação a ambientações futuristas distópicas e até mesmo em relação à ficção científica como um todo.

Da maneira como entendo, uma confirmação disso é o fato de a grande maioria dos filmes policiais com ambientação futurista terem sido influenciados, ainda que minimamente, por Blade Runner. No momento, não consigo pensar em um que não seja.

Dito isso, não se trata de um filme que se sustenta apenas por seu apelo visual, mas também pela qualidade do enredo, que toca em temas como a própria definição de humanidade, por apresentar os replicantes, que não apenas são impossíveis de distinguir em relação aos humanos, como são muitas vezes retratados com mais humanidade que seus perseguidores.

É justamente aí que vem minha segunda surpresa com a nova versão: eu imaginava que, dada a temática mais complexa do que o normal para o gênero e a exuberância da ambientação, o voice-over de Deckard era uma bela ajuda para se aprofundar ainda mais em todo esse universo de Blade Runner. Mas isso foi realmente um engano meu: o filme torna-se mais eficiente sem o falatório todo. Mais quieto, negro e sinistro, como o próprio universo que ele apresenta, a ponto de me fazer realmente perceber que o voice-over não estava mesmo nos planos do cineasta, foi adicionado depois, tornando a versão original do filme algo "for dummies".

O mesmo pode ser dito sobre o final feliz: nesta versão definitiva, o filme acaba com Deckard e Racheal entrando no elevador. O que pode vir a acontecer com eles fica como exercício para a imaginação. "It's too bad she won't live, but then again, who does?" Impressionante como agora faz sentido essa frase, dita pelo sinistro Gaff, pouco antes do final. Na versão original de Blade Runner, após a cena do elevador vem uma cena em uma paisagem clara e bonita, mostrando Racheal e Deckard num carro, fugindo rumo à felicidade.

O que, vai me dizer que essa cena distoa de um filme que é todo escuro, sombrio? Ou que ainda o comentário final de Deckard na versão original, dizendo que na verdade Racheal era uma replicante diferente, que viveria pra sempre (ie, felizes para sempre), além de desfazer completamente o sentido da frase do Gaff, caberia mais num conto de fadas do que em um ("O") film noir futurista?

Pois é... estranho como só agora eu percebi isso tudo!